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Atenção:

- Lei extraída do site www.planalto.gov.br. Pode conter anotações pessoais, jurisprudência de tribunais, negritos e realces de texto para fins didáticos.

- Última revisão no texto legal em 12/01/2023.

- Para pesquisar palavras-chave na página clique as teclas: "Ctrl + F" (Windows) ou "Command + F" (Mac).

Lei n.º 7.716, de 5 de janeiro de 1989.

Define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor.

Mensagem de veto

Vide Lei nº 12.735, de 2012

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1.º Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. (Redação dada pela Lei n.º 9.459, de 15/05/97)

 

Redação anterior:

"Art. 1.º Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de preconceitos de raça ou de cor."

Legislação correlata:

- Vide: Art. 140 do Código Penal - Crime de injúria.

- Vide: Constituição Federal/1988

"Art. 1.º da CF/1988. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania;

II - a cidadania

III - a dignidade da pessoa humana; (...)"

"Art. 3.º da CF/1988. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; (...)

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação."

"Art. 5.º da CF/1988. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; (...)

XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;

XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;"

- Vide: Lei n.º 12.260/2016 - Disciplina o terrorismo e organização terrorista.

- Vide: Decreto n.º 10.932/2022 - Promulga a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância, firmado pela República Federativa do Brasil, na Guatemala, em 5 de junho de 2013.

Notas:

- O crime de injúria racial, antes previsto no art. 140, parágrafo 3.º, do Código Penal, era imprescritível, segundo decidido pelo STF (vide aresto abaixo).

- Vide majorantes previstas nos arts. 20-A e 20-B desta Lei.

Jurisprudência:

01) Crime de injúria racial - Infração penal imprescritível:

Notícias do STF - 28/10/2021 - 20h45

Injúria racial é crime imprescritível, decide STF

Para a maioria do Plenário, a injúria configura um dos tipos de racismo.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quinta-feira (28), que o crime de injúria racial configura um dos tipos penais de racismo e é imprescritível. Por maioria de votos, o colegiado negou o Habeas Corpus (HC) 154248, em que a defesa de uma mulher condenada por ter ofendido uma trabalhadora com termos racistas pedia a declaração da prescrição da condenação, porque tinha mais de 70 anos quando a sentença foi proferida.

Injúria qualificada

L.M.S., atualmente com 80 anos, foi condenada, em 2013, a um ano de reclusão e 10 dias-multa pelo juízo da Primeira Vara Criminal de Brasília (DF) por ter ofendido uma frentista de posto de combustíveis, chamando-a de “negrinha nojenta, ignorante e atrevida”. A prática foi enquadrada como crime de injúria qualificada pelo preconceito (artigo 140, parágrafo 3º, do Código Penal). Ao analisar recurso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o crime de injúria racial seria uma categoria do crime de racismo, que é imprescritível.

Equivalência

Em voto apresentado em novembro de 2020, o relator do HC, ministro Edson Fachin, concordou com o entendimento do STJ e negou o habeas corpus. Segundo o ministro, com a alteração legal que tornou pública condicionada (que depende de representação da vítima) a ação penal para processar e julgar os delitos de injúria racial, o crime passou a ser equivalente ao de racismo e, portanto, imprescritível, conforme previsto na Constituição Federal (artigo 5º, inciso LXII).

Prescrição

Único a divergir, o ministro Nunes Marques considerou que os crimes de racismo e injúria racial não se equiparam, o que possibilita a decretação da prescrição.

Crime inafiançável

Em voto-vista apresentado nesta tarde, o ministro Alexandre de Moraes observou que a Constituição é explícita ao declarar que o racismo é crime inafiançável, sem fazer distinção entre os diversos tipos penais que configuram essa prática. O ministro lembrou que, segundo os fatos narrados nos autos, a conduta praticada por L.M.S. foi uma manifestação ilícita, criminosa e preconceituosa em relação à condição de negra da vítima. “Como dizer que isso não é a prática de racismo?”, indagou.

Inferiorização da vítima

Segundo ele, não é possível reconhecer a prescrição em um caso em que foi demonstrado que a agressora pretendeu, claramente, inferiorizar sua vítima. Ele considera necessário interpretar de forma plena o que é previsto pela Constituição quanto ao crime de racismo, incluindo a imprescritibilidade, para produzir resultados efetivos para extirpar essa prática, “promovendo uma espécie de compensação pelo tratamento aviltante dispensado historicamente à população negra no Brasil e viabilizando um acesso diferenciado à responsabilização penal daqueles que, tradicionalmente, vêm desrespeitando os negros”, afirmou.

Racismo estrutural

No mesmo sentido, o ministro Luís Roberto Barroso observou que, embora com atraso, o país está reconhecendo a existência do racismo estrutural. Ele salientou que não são apenas as ofensas, pois muitas vezes a linguagem naturalizada embute um preconceito. “Não podemos ser condescendentes com essa continuidade de práticas e de linguagem que reproduzem o padrão discriminatório”, disse.

Também para a ministra Rosa Weber, as ofensas decorrentes da raça, da cor, da religião, da etnia ou da procedência nacional se inserem no âmbito conceitual do racismo e, por este motivo, são inafiançáveis e imprescritíveis.

Dignidade

No mesmo sentido, a ministra Cármen Lúcia considera que, nesse caso, o crime não é apenas contra a vítima, pois a ofensa é contra a dignidade do ser humano. Ela ressaltou que, de acordo com o Atlas da Violência, em 2018, os negros foram 75,7% das vítimas de homicídio. “Vivemos numa sociedade na qual o preconceito é enorme, e o preconceito contra pessoas negras é muito maior”, apontou.

Tratados internacionais

O ministro Ricardo Lewandowski salientou que a Constituição, ao estabelecer que a prática de racismo é imprescritível, não estipulou nenhum tipo penal. Segundo ele, isso ocorre porque, ao longo do tempo, essas condutas criminosas se diversificam e é necessário que os delitos específicos sejam definidos pelo Congresso Nacional. Lewandowski também lembrou que o Brasil é signatário de tratados e convenções internacionais em que se compromete a combater o racismo.

O ministro Dias Toffoli também acompanhou o entendimento pela imprescritibilidade do delito de injúria racial.

Efetividade das normas

Para o ministro Luiz Fux , presidente do STF, a discussão sobre a questão racial veio se desenvolvendo para assegurar proteção às pessoas negras e vem passando por uma série de mutações, alcançando uma dimensão social, e não meramente biológica. “As normas constitucionais dessa sociedade, que já foi escravocrata durante 400 anos e um péssimo exemplo para todo o mundo, só se podem tornar efetivas através não só da previsão em abstrato, mas da punição”, afirmou.

Processo relacionado: HC 154248

(Fonte: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=475646)

02) Injúria racial vs. Crime de racismo – Legitimidade do Ministério Público Federal para propor ação penal – Crime em aeronave – Competência da Justiça Federal:

 

Injúria Preconceituosa e Legitimidade do Ministério Público - 1 (Informativo n.º 497 do STF – Primeira Turma)

A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus impetrado em favor de 2 cidadãos norte-americanos que pleiteavam o trancamento de ação penal contra eles instaurada pela suposta prática do ato de preconceito de procedência nacional (Lei 7.716/89, art. 20: “Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.”). No caso, durante vôo internacional, um dos pacientes, com o incentivo de seu colega, também comissário de bordo, teria supostamente ofendido um passageiro brasileiro. Alegava a impetração: a) ilegitimidade do Ministério Público Federal para propor a ação penal, porque os fatos narrados na inicial configurariam, em tese, o crime previsto no art. 140, § 3º, do CP, de iniciativa do ofendido, e não o delito de injúria preconceituosa; e b) falta de justa causa para a ação penal, pois não haveria, nos autos, prova material suficiente para embasar a imputação. HC 90187/RJ, rel. Min. Menezes Direito, 4.3.2008.   (HC-90187)

Injúria Preconceituosa e Legitimidade do Ministério Público - 2

Entendeu-se que, na espécie, a questão relativa à legitimidade ad causam do MPF se confundiria com a própria necessidade de se instruir a ação penal, haja vista que seria no momento da prolação da sentença que o juiz poderia confirmar o tipo penal indicado na inicial acusatória ou, se reputar conveniente, desclassificar a conduta descrita, nos termos previstos no art. 383 (emendatio libelli) ou no art. 384 (mutatio libelli) do CPP. Dessa forma, concluiu-se que qualquer capitulação jurídica feita sobre um fato na denúncia é sempre provisória até a sentença, tornando-se definitiva apenas no instante decisório final. Logo, não caberia ao STF, em habeas corpus, antecipar-se ao magistrado de primeiro grau e, antes de iniciada a instrução criminal, firmar juízo de valor sobre as provas indiciárias trazidas aos autos para tipificar a conduta criminosa descrita. Rejeitou-se, de igual modo, o argumento de ausência de justa causa para a ação penal, porquanto existiriam elementos concretos suficientes com relação aos pacientes para amparar a denúncia, nos moldes em que fora proposta, e ensejar a continuidade da persecução penal. Ademais, salientou-se a jurisprudência consolidada da Corte no sentido de que o trancamento da ação penal por tal motivo, em sede de habeas corpus, constitui medida excepcional que, em princípio, não tem lugar quando os fatos narrados na denúncia caracterizam crime em tese. Enfatizou-se, por fim, que o contraditório se desenvolveria na ação penal, na qual produzidos os elementos de convicção do julgador e garantidos aos pacientes todos os meios de defesa constitucionalmente previstos. Vencido o Min. Marco Aurélio que, por considerar que a definição sobre tratar-se de ação penal pública ou privada não dependeria de prova posterior, mas da descrição do fato narrado, deferia o writ para assentar que a presente ação necessitaria da iniciativa da vítima (CP, art. 141, § 3º) e que, no tocante ao segundo paciente, não se teria peça hábil a chegar-se a persecução criminal, já que deficiente quanto à exposição do verbo “incitar”.

STF - HC 90187/RJ, rel. Min. Menezes Direito, 4.3.2008.   (HC-90187)

03) Discriminação - Crimes de homofobia e transfobia - Comunidade LGBT - Omissão legislativa - Criminalização:

DIREITO CONSTITUCIONAL – AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO (Informativo n.º 941 do STF – Plenário)

Homofobia e omissão legislativa – 3

O Plenário retomou o julgamento conjunto de ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO) e mandado de injunção ajuizados em face de alegada omissão legislativa do Congresso Nacional em editar lei que criminalize os atos de homofobia e transfobia (Informativos 930 e 931).

O partido político autor da ação direta de inconstitucionalidade por omissão alega inércia legislativa do Congresso Nacional em apreciar proposições legislativas apresentadas com o objetivo de incriminar todas as formas de homofobia e transfobia e, assim, garantir efetiva proteção jurídico-social aos integrantes da comunidade LGBT.

Já o impetrante do mandado de injunção aponta a mora do Congresso no sentido de proceder à criminalização específica de todas as formas de homofobia e transfobia, especialmente das ofensas individuais e coletivas, bem como de homicídios, agressões, ameaças e discriminações motivadas pela orientação sexual ou identidade de gênero.

Nesta assentada, o ministro Celso de Mello (relator da ADO) noticiou o recebimento, pouco antes do início da sessão, de comunicação do Senado Federal. No expediente, aquele órgão fez saber que: (i) a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania daquela Casa (CCJ), em 22.5.2019, aprovou substitutivo do relator ao Projeto de Lei 672/2019, que aprimora a Lei 7.716/1989 para incluir os crimes de discriminação ou preconceito de orientação sexual e/ou identidade de gênero. O substitutivo será submetido a turno suplementar, em apreciação terminativa; e (ii) na mesma reunião ordinária, a CCJ aprovou, em caráter terminativo, o Projeto de Lei 191/2017, que altera a redação do art. 2º da Lei 11.340/2006, para incluir, entre os valores protegidos pela Lei Maria da Penha, também a identidade de gênero, como forma de atender aos indivíduos transgêneros identificados com o sexo feminino. Na parte final, a comunicação, em atenção ao dever das partes de colaborar com o Poder Judiciário, informa os aludidos fatos supervenientes que demonstram estar a matéria objeto de apreciação do Supremo Tribunal Federal (STF) sendo apreciada pelo Senado Federal, no exercício de sua competência constitucional típica de aprimorar a legislação penal existente.

O colegiado passou, então, a examinar questão relativa à prejudicialidade do processamento e definitiva conclusão do julgamento do processo de controle normativo abstrato. Por maioria, decidiu dar regular prosseguimento à ação.

Prevaleceu o voto do ministro Celso de Mello, que compreendeu não se registrar situação configuradora de prejudicialidade. O relator da ADO asseverou que a mera existência de proposições legislativas em trâmite no Congresso Nacional não tem o condão de afastar, por si só, a configuração, na espécie, de inércia por parte do Poder Legislativo.

Não se desconheceu que o STF, no passado, veio a acolher o entendimento de que a mera instauração do processo legislativo, com o envio do correspondente projeto de lei às Casas do Congresso Nacional para deliberação e aprovação, descaracterizaria, por si só, a configuração da mora no adimplemento da imposição constitucional. Essa diretriz, no entanto, ficou integralmente superada pela jurisprudência após o exame em Plenário da ADI 3.682, em maio de 2007. Na ocasião, o STF assinalou que o estado de mora legislativa pode restar configurado tanto na fase inaugural do processo de elaboração das leis (mora agendi) quanto no estágio de deliberação sobre as proposições já veiculadas (mora deliberandi), desde que evidenciada, pela superação excessiva de prazo razoável, inércia abusiva e inconstitucional do Poder Legislativo. Admitiu-se que a inertia deliberandi das Casas Legislativas pode ser objeto da ação direta de inconstitucionalidade por omissão. O entendimento sobre a questão a envolver a mora decorrente da inertia deliberandi foi reafirmado na ADO 25.

No caso da ADO 26, passaram-se trinta anos desde o início da vigência da Constituição Federal de 1988 (CF) e dezoito, pelo menos, a contar da apresentação, perante a Câmara dos Deputados, de projeto de lei com o intuito de dar implementação efetiva às cláusulas constitucionais em exame.

O relator sublinhou que a constatação objetiva de hipótese de mora inconstitucional, apta a instaurar situação de injusta omissão geradora de manifesta lesividade à posição jurídica das pessoas tuteladas pela cláusula constitucional inadimplida [CF, art. 5º, XLI e XLII (1)], justifica, plenamente, a intervenção do Poder Judiciário, notadamente a do STF. Na espécie, subsiste a mora legislativa, caracterizada pelo estado de inertia deliberandi dos órgãos estatais.

Ainda ponderou que, também por essa razão, em sede de ações de mandado de injunção, a Corte tem reconhecido, em sucessivos precedentes, que o retardamento abusivo na regulamentação legislativa do texto constitucional, não obstante a existência de projetos de lei em tramitação, qualifica-se como requisito autorizador da concessão da ordem injuncional.

Noutro passo, o ministro discorreu sobre a complexidade do iter formativo das leis, cujo processo de elaboração pode estender-se por longo período de tramitação em ambas as Casas do Congresso Nacional, uma vez que o procedimento legislativo é regido, em nosso sistema constitucional, pelo modelo que consagra a prática do bicameralismo. O processo de formação das leis é composto de três fases rituais distintas: (i) fase introdutória (apresentação da proposição legislativa); (ii) fase constitutiva, que se desenvolve primeiro na instância parlamentar e depois no Poder Executivo (sanção e/ou veto); e (iii) fase complementar (promulgação e publicação da lei).

Por fim, advertiu que, apesar das deliberações em caráter terminativo, o procedimento de elaboração legislativa das proposições divulgadas na comunicação do Senado sequer se acha concluído na esfera daquela Câmara Alta.

Vencidos os ministros Marco Aurélio e Dias Toffoli (presidente), que reputaram ser conveniente a suspensão do julgamento para aguardar-se os trabalhos a serem desenvolvidos no Congresso Nacional.

Ato contínuo, o Plenário deu andamento ao exame da ADO e do mandado de injunção. Votaram os ministros Rosa Weber e Luiz Fux, que acompanharam o pronunciamento de ambos os relatores.

Em seguida, o julgamento foi suspenso.

(1) CF/1988: “Art. 5º (...) XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;”

ADO 26/DF, rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 23.5.2019. (ADO-26)

MI 4733/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 23.5.2019. (MI-4733)

DIREITO CONSTITUCIONAL – AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO (Informativo n.º 944 do STF – Plenário)

Homofobia e omissão legislativa – 4  

Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, julgou procedentes os pedidos formulados em ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO) e em mandado de injunção (MI) para reconhecer a mora do Congresso Nacional em editar lei que criminalize os atos de homofobia e transfobia. Determinou, também, até que seja colmatada essa lacuna legislativa, a aplicação da Lei 7.716/1989 (que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor) às condutas de discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero, com efeitos prospectivos e mediante subsunção.

​Prevaleceram os votos dos ministros Celso de Mello e Edson Fachin, relatores da ADO e do MI, respectivamente (Informativo 931). A corrente majoritária reconheceu, em suma, que a omissão do Congresso Nacional atenta contra a Constituição Federal (CF), a qual impõe, nos termos do seu art. 5º, XLI e XLII (1), inquestionável mandado de incriminação. Entendeu que as práticas homotransfóbicas se qualificam como espécies do gênero racismo, na dimensão de racismo social consagrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do HC 82.424/RS (caso Ellwanger). Isso porque essas condutas importam em atos de segregação que inferiorizam os integrantes do grupo de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais (LGBT), em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero. Considerou, ademais, que referidos comportamentos se ajustam ao conceito de atos de discriminação e de ofensa aos direitos e liberdades fundamentais dessas pessoas.

​Na ADO, o colegiado, por maioria, fixou a seguinte tese:

1. Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08.01.1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”);

2. A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer que seja a denominação confessional professada, a cujos fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e líderes ou celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outros) é assegurado o direito de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordo com o que se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem assim o de ensinar segundo sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público ou privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero;

3. O conceito de racismo, compreendido em sua dimensão social, projeta-se para além de aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta, enquanto manifestação de poder, de uma construção de índole histórico-cultural motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e destinada ao controle ideológico, à dominação política, à subjugação social e à negação da alteridade, da dignidade e da humanidade daqueles que, por integrarem grupo vulnerável (LGBTI+) e por não pertencerem ao estamento que detém posição de hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos e diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico, expostos, em consequência de odiosa inferiorização e de perversa estigmatização, a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de proteção do direito”.

​Ficaram vencidos, em ambas as ações, os ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Marco Aurélio.

​Os dois primeiros conheceram em parte das ações e as julgaram parcialmente procedentes apenas para reconhecer a mora legislativa e dar ciência ao Congresso Nacional para a adoção das providências necessárias. Para eles, não obstante a repugnância que provocam as condutas preconceituosas de qualquer tipo, somente o Poder Legislativo pode criminalizar condutas, sendo imprescindível lei em sentido formal. Portanto, a extensão do tipo penal para abarcar situações não especificamente tipificadas pela norma penal incriminadora atenta contra o princípio da reserva legal (2). ​O ministro Marco Aurélio inadmitiu o MI, diante dos limites impostos ao exercício, pelo STF, da jurisdição constitucional. Admitiu, em parte, a ADO, para julgar, nessa extensão, improcedente o pedido, por não assentar, peremptoriamente, que se tenha “criminalizar” no vocábulo “punirá”, contido no inciso XLI do art. 5º da CF. Em decorrência disso, não reconheceu a omissão legislativa quanto à criminalização específica da homofobia e da transfobia. Concluiu que, respeitada a liberdade legiferante franqueada ao legislador ordinário, espera-se que a sinalização do STF quanto à necessária proteção das minorias e dos grupos socialmente vulneráveis contribua para a formação de uma cultura livre de todo e qualquer preconceito e discriminação, preservados os limites da separação dos Poderes e da reserva legal em termos penais.

(1) CF/1988: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:(...) XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;”

(2) CF/1988: “Art. 5º (...) XXXIX – não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;”

STF - ​ADO 26/DF, rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 13.6.2019. (ADO-26)

STF - MI 4733/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 13.6.2019. (MI-4733)

04) Ofensas contra pessoas LGBTQIAPN+ - Racismo - Omissão legislativa - Homotransfobia - Crime de injúria racial:

Notícias do STF - 22/08/2023

STF equipara ofensas contra pessoas LGBTQIAPN+ a crime de injúria racial

A decisão afasta interpretação que retirava parte da aplicabilidade da decisão do Plenário sobre a criminalização da homotransfobia.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu que atos ofensivos praticados contra pessoas da comunidade LGBTQIAPN+ podem ser enquadrados como injúria racial. A decisão foi tomada na sessão virtual concluída em 21/8, no julgamento de recurso (embargos de declaração) apresentado pela Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT) contra acórdão no Mandado de Injunção (MI) 4733.

Enquadramento

No julgamento do mandado de injunção, em junho de 2019, o Tribunal havia reconhecido a omissão do Congresso Nacional em criminalizar a discriminação por identidade de gênero e orientação sexual e determinado o enquadramento da homotransfobia no tipo penal definido na Lei do Racismo (Lei 7.716/1989), até que o Legislativo edite lei sobre a matéria.

Interpretação equivocada

Nos embargos, a ABGLT alegava que essa decisão tem sido interpretada de forma equivocada, no sentido de que a ofensa contra grupos LGBTQIAPN+ configura racismo, mas a ofensa à honra de pessoas pertencentes a esses grupos vulneráveis não configura o crime de injúria racial (artigo 140, parágrafo 3º, do Código Penal). Segundo a associação, isso retira, em grande parte, a aplicabilidade prática da decisão do Plenário, e, por isso, pediu que se defina que o entendimento também se aplica ao crime de injúria racial.

Desamparo

Em seu voto pelo acolhimento do recurso, o relator, ministro Edson Fachin, explicou que, no julgamento do Habeas Corpus (HC) 154248, também de sua relatoria, o STF já havia reconhecido que o crime de injúria racial é espécie do gênero racismo e, portanto, é imprescritível. Essa posição também foi inserida na legislação pelo Congresso Nacional por meio da Lei 14.532/2023. Assim, para o relator, uma vez que a Corte, no julgamento do MI, reconheceu que a discriminação por identidade de gênero e orientação sexual configura racismo, a prática da homotransfobia pode configurar crime de injúria racial. "A interpretação que restringe sua aplicação aos casos de racismo e mantém desamparadas de proteção as ofensas racistas perpetradas contra indivíduos da comunidade LGBTQIAPN+ contraria não apenas o acórdão embargado, mas toda a sistemática constitucional", afirmou.

Ampliação

Ficou vencido o ministro Cristiano Zanin, para quem a análise da matéria não é possível no âmbito de embargos de declaração, pois seria um novo julgamento do MI com ampliação do mérito.

Processo relacionado: MI 4733

(Fonte: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=512663)

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MANDADO DE INJUNÇÃO. DEVER DO ESTADO DE CRIMINALIZAR AS CONDUTAS ATENTATÓRIAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. HOMOTRANSFOBIA. DISCRIMINAÇÃO INCONSTITUCIONAL. OMISSÃO DO CONGRESSO NACIONAL. HOMOTRANSFOBIA COMO RACISMO POR RAÇA. INJÚRIA RACIAL COMO ESPÉCIE DE RACISMO. PRECEDENTES. ATOS DE HOMOTRANSFOBIA PRATICADOS CONTRA MEMBROS DA COMUNIDADE LGBTQIA+ CONFIGURAM INJÚRIA RACIAL. OBSCURIDADE. EMBARGOS ACOLHIDOS

1. Diferentemente dos demais recursos, os embargos de declaração não se prestam a reforma da decisão, sendo cabíveis apenas nos casos de obscuridade, contradição ou omissão da decisão impugnada, bem como para corrigir eventual erro material (art. 1.022, do Código de Processo Civil.

2. Mandado de injunção julgado procedente, para (i) reconhecer a mora inconstitucional do Congresso Nacional e; (ii) aplicar, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito, a Lei 7.716/89 à discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero.

3. O crime de injúria racial reúne todos os elementos necessários à sua caracterização como uma das espécies de racismo e por ser espécie do gênero racismo, o crime de injúria racial é imprescritível. Precedentes. Entendimento positivado pela Lei 14.532/2023.

4. Tendo em vista que a injúria racial constitui uma espécie do crime de racismo, e que a discriminação por identidade de gênero e orientação sexual configura racismo por raça, a prática da homotransfobia pode configurar crime de injúria racial.

5. Embargos de Declaração conhecidos e acolhidos para sanar obscuridade.

Art. 2.º (Vetado).

Art. 2º-A Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional.     (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

Pena: reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.       (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

Parágrafo único. A pena é aumentada de metade se o crime for cometido mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas.       (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

Legislação correlata:

- Vide: Art. 5.º, inc. XLII, da Constituição Federal/1988 - Racismo.

- Vide: Art. 29 do Código Penal - Concurso de pessoas.

- Vide: Art. 140 do Código Penal - Crime de injúria.

Notas:

- O crime de injúria racial, antes previsto no art. 140, parágrafo 3.º, do Código Penal, era imprescritível, segundo decidido pelo STF (vide aresto abaixo).

- Vide majorantes previstas nos arts. 20-A e 20-B desta Lei.

Jurisprudência:

01) Ofensas contra pessoas LGBTQIAPN+ - Racismo - Omissão legislativa - Homotransfobia - Crime de injúria racial:

Notícias do STF - 22/08/2023

STF equipara ofensas contra pessoas LGBTQIAPN+ a crime de injúria racial

A decisão afasta interpretação que retirava parte da aplicabilidade da decisão do Plenário sobre a criminalização da homotransfobia.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu que atos ofensivos praticados contra pessoas da comunidade LGBTQIAPN+ podem ser enquadrados como injúria racial. A decisão foi tomada na sessão virtual concluída em 21/8, no julgamento de recurso (embargos de declaração) apresentado pela Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT) contra acórdão no Mandado de Injunção (MI) 4733.

Enquadramento

No julgamento do mandado de injunção, em junho de 2019, o Tribunal havia reconhecido a omissão do Congresso Nacional em criminalizar a discriminação por identidade de gênero e orientação sexual e determinado o enquadramento da homotransfobia no tipo penal definido na Lei do Racismo (Lei 7.716/1989), até que o Legislativo edite lei sobre a matéria.

Interpretação equivocada

Nos embargos, a ABGLT alegava que essa decisão tem sido interpretada de forma equivocada, no sentido de que a ofensa contra grupos LGBTQIAPN+ configura racismo, mas a ofensa à honra de pessoas pertencentes a esses grupos vulneráveis não configura o crime de injúria racial (artigo 140, parágrafo 3º, do Código Penal). Segundo a associação, isso retira, em grande parte, a aplicabilidade prática da decisão do Plenário, e, por isso, pediu que se defina que o entendimento também se aplica ao crime de injúria racial.

Desamparo

Em seu voto pelo acolhimento do recurso, o relator, ministro Edson Fachin, explicou que, no julgamento do Habeas Corpus (HC) 154248, também de sua relatoria, o STF já havia reconhecido que o crime de injúria racial é espécie do gênero racismo e, portanto, é imprescritível. Essa posição também foi inserida na legislação pelo Congresso Nacional por meio da Lei 14.532/2023. Assim, para o relator, uma vez que a Corte, no julgamento do MI, reconheceu que a discriminação por identidade de gênero e orientação sexual configura racismo, a prática da homotransfobia pode configurar crime de injúria racial. "A interpretação que restringe sua aplicação aos casos de racismo e mantém desamparadas de proteção as ofensas racistas perpetradas contra indivíduos da comunidade LGBTQIAPN+ contraria não apenas o acórdão embargado, mas toda a sistemática constitucional", afirmou.

Ampliação

Ficou vencido o ministro Cristiano Zanin, para quem a análise da matéria não é possível no âmbito de embargos de declaração, pois seria um novo julgamento do MI com ampliação do mérito.

Processo relacionado: MI 4733

(Fonte: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=512663)

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MANDADO DE INJUNÇÃO. DEVER DO ESTADO DE CRIMINALIZAR AS CONDUTAS ATENTATÓRIAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. HOMOTRANSFOBIA. DISCRIMINAÇÃO INCONSTITUCIONAL. OMISSÃO DO CONGRESSO NACIONAL. HOMOTRANSFOBIA COMO RACISMO POR RAÇA. INJÚRIA RACIAL COMO ESPÉCIE DE RACISMO. PRECEDENTES. ATOS DE HOMOTRANSFOBIA PRATICADOS CONTRA MEMBROS DA COMUNIDADE LGBTQIA+ CONFIGURAM INJÚRIA RACIAL. OBSCURIDADE. EMBARGOS ACOLHIDOS

1. Diferentemente dos demais recursos, os embargos de declaração não se prestam a reforma da decisão, sendo cabíveis apenas nos casos de obscuridade, contradição ou omissão da decisão impugnada, bem como para corrigir eventual erro material (art. 1.022, do Código de Processo Civil.

2. Mandado de injunção julgado procedente, para (i) reconhecer a mora inconstitucional do Congresso Nacional e; (ii) aplicar, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito, a Lei 7.716/89 à discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero.

3. O crime de injúria racial reúne todos os elementos necessários à sua caracterização como uma das espécies de racismo e por ser espécie do gênero racismo, o crime de injúria racial é imprescritível. Precedentes. Entendimento positivado pela Lei 14.532/2023.

4. Tendo em vista que a injúria racial constitui uma espécie do crime de racismo, e que a discriminação por identidade de gênero e orientação sexual configura racismo por raça, a prática da homotransfobia pode configurar crime de injúria racial.

5. Embargos de Declaração conhecidos e acolhidos para sanar obscuridade.

Art. 3.º Impedir ou obstar o acesso de alguém, devidamente habilitado, a qualquer cargo da Administração Direta ou Indireta, bem como das concessionárias de serviços públicos.

Pena: reclusão de dois a cinco anos.

Parágrafo único.  Incorre na mesma pena quem, por motivo de discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, obstar a promoção funcional. (Incluído pela Lei n.º 12.288, de 2010) (Vigência)

3.º

Art. 4.º Negar ou obstar emprego em empresa privada. 

Pena: reclusão de dois a cinco anos.

§ 1.º  Incorre na mesma pena quem, por motivo de discriminação de raça ou de cor ou práticas resultantes do preconceito de descendência ou origem nacional ou étnica:  (Incluído pela Lei n.º 12.288, de 2010) (Vigência)

I - deixar de conceder os equipamentos necessários ao empregado em igualdade de condições com os demais trabalhadores; (Incluído pela Lei n.º 12.288, de 2010) (Vigência)

II - impedir a ascensão funcional do empregado ou obstar outra forma de benefício profissional;  (Incluído pela Lei n.º 12.288, de 2010) (Vigência)

III - proporcionar ao empregado tratamento diferenciado no ambiente de trabalho, especialmente quanto ao salário. (Incluído pela Lei n.º 12.288, de 2010) (Vigência)

§ 2.º  Ficará sujeito às penas de multa e de prestação de serviços à comunidade, incluindo atividades de promoção da igualdade racial, quem, em anúncios ou qualquer outra forma de recrutamento de trabalhadores, exigir aspectos de aparência próprios de raça ou etnia para emprego cujas atividades não justifiquem essas exigências. (Incluído pela Lei n.º 12.288, de 2010) (Vigência)

4.º

Art. 5.º Recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, negando-se a servir, atender ou receber cliente ou comprador.

Pena: reclusão de um a três anos.

5.º

Art. 6.º Recusar, negar ou impedir a inscrição ou ingresso de aluno em estabelecimento de ensino público ou privado de qualquer grau.

Pena: reclusão de três a cinco anos.

Parágrafo único. Se o crime for praticado contra menor de 18 (dezoito) anos a pena é agravada de 1/3 (um terço).

Art. 7.º Impedir o acesso ou recusar hospedagem em hotel, pensão, estalagem, ou qualquer estabelecimento similar.

Pena: reclusão de três a cinco anos.

Art. 8.º Impedir o acesso ou recusar atendimento em restaurantes, bares, confeitarias, ou locais semelhantes abertos ao público.

Pena: reclusão de um a três anos.

Art. 9.º Impedir o acesso ou recusar atendimento em estabelecimentos esportivos, casas de diversões, ou clubes sociais abertos ao público.

Pena: reclusão de um a três anos.

Art. 10. Impedir o acesso ou recusar atendimento em salões de cabeleireiros, barbearias, termas ou casas de massagem ou estabelecimento com as mesmas finalidades.

Pena: reclusão de um a três anos.

Art. 11. Impedir o acesso às entradas sociais em edifícios públicos ou residenciais e elevadores ou escada de acesso aos mesmos:

Pena: reclusão de um a três anos.

Art. 12. Impedir o acesso ou uso de transportes públicos, como aviões, navios barcas, barcos, ônibus, trens, metrô ou qualquer outro meio de transporte concedido.

Pena: reclusão de um a três anos.

12

Art. 13. Impedir ou obstar o acesso de alguém ao serviço em qualquer ramo das Forças Armadas.

Pena: reclusão de dois a quatro anos.

Art. 14. Impedir ou obstar, por qualquer meio ou forma, o casamento ou convivência familiar e social.

Pena: reclusão de dois a quatro anos.

Art. 15. (Vetado).

Art. 16. Constitui efeito da condenação a perda do cargo ou função pública, para o servidor público, e a suspensão do funcionamento do estabelecimento particular por prazo não superior a 03 (três) meses.

 

Nota:

- Vide: Art. 92 do Código Penal - Efeitos da condenação.

Art. 17. (Vetado).

Art. 18. Os efeitos de que tratam os arts. 16 e 17 desta Lei não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença.

Art. 19. (Vetado).

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. (Redação dada pela Lei n.º 9.459, de 15/05/97)

Pena: reclusão de um a três anos e multa. (Redação dada pela Lei n.º 9.459, de 15/05/97)

§ 1.º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo. (Redação dada pela Lei n.º 9.459, de 15/05/97)

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa. (Incluído pela Lei n.º 9.459, de 15/05/97)

§ 2.º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza: (Redação dada pela Lei n.º 9.459, de 15/05/97)

§ 2º-A Se qualquer dos crimes previstos neste artigo for cometido no contexto de atividades esportivas, religiosas, artísticas ou culturais destinadas ao público:       (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

Pena: reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e proibição de frequência, por 3 (três) anos, a locais destinados a práticas esportivas, artísticas ou culturais destinadas ao público, conforme o caso.     (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

§ 2º-B Sem prejuízo da pena correspondente à violência, incorre nas mesmas penas previstas no caput deste artigo quem obstar, impedir ou empregar violência contra quaisquer manifestações ou práticas religiosas.     (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

Pena: reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos e multa. (Incluído pela Lei n.º 9.459, de 15/05/97)

§ 3º No caso do § 2º deste artigo, o juiz poderá determinar, ouvido o Ministério Público ou a pedido deste, ainda antes do inquérito policial, sob pena de desobediência:      (Redação dada pela Lei nº 14.532, de 2023)

I - o recolhimento imediato ou a busca e apreensão dos exemplares do material respectivo; (Incluído pela Lei n.º 9.459, de 15/05/97)

II - a cessação das respectivas transmissões radiofônicas, televisivas, eletrônicas ou da publicação por qualquer meio; (Redação dada pela Lei n.º 12.735, de 2012)

III - a interdição das respectivas mensagens ou páginas de informação na rede mundial de computadores. (Incluído pela Lei n.º 12.288, de 2010)

§ 4.º Na hipótese do § 2.º, constitui efeito da condenação, após o trânsito em julgado da decisão, a destruição do material apreendido. (Incluído pela Lei n.º 9.459, de 15/05/97)

Redação anterior:

"§ 3.º No caso do parágrafo anterior, o juiz poderá determinar, ouvido o Ministério Público ou a pedido deste, ainda antes do inquérito policial, sob pena de desobediência: (Redação dada pela Lei n.º 9.459, de 15/05/97)"

"II - a cessação das respectivas transmissões radiofônicas ou televisivas.(Incluído pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)"

Legislação correlata:

- Vide:

"Art. 1.º da CF/1988. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...)

II - a cidadania

III - a dignidade da pessoa humana; (...)"

"Art. 3.º da CF/1988. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; (...)

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação."

"Art. 5.º da CF/1988. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; (...)

XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;

XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;"

- Vide: Arts. 519 a 523 do CPP.

- Vide:

"Art. 85 do CPP. Nos processos por crime contra a honra, em que forem querelantes as pessoas que a Constituição sujeita à jurisdição do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Apelação, àquele ou a estes caberá o julgamento, quando oposta e admitida a exceção da verdade."

- Vide: Lei n.º 12.260/2016 - Disciplina o terrorismo e organização terrorista.

- Vide: Lei n.º 12.735/2012 - Delegacias digitais.

"Art. 4.º Os órgãos da polícia judiciária estruturarão, nos termos de regulamento, setores e equipes especializadas no combate à ação delituosa em rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado."

Notas:

- O crime de injúria racial, antes previsto no art. 140, parágrafo 3.º, do Código Penal, era imprescritível, segundo decidido pelo STF (vide aresto abaixo).

- Vide majorantes previstas nos arts. 20-A e 20-B desta Lei.

Jurisprudência:

01) Crime de injúria racial - Infração penal imprescritível:

Notícias do STF - 28/10/2021 - 20h45

Injúria racial é crime imprescritível, decide STF

Para a maioria do Plenário, a injúria configura um dos tipos de racismo.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quinta-feira (28), que o crime de injúria racial configura um dos tipos penais de racismo e é imprescritível. Por maioria de votos, o colegiado negou o Habeas Corpus (HC) 154248, em que a defesa de uma mulher condenada por ter ofendido uma trabalhadora com termos racistas pedia a declaração da prescrição da condenação, porque tinha mais de 70 anos quando a sentença foi proferida.

Injúria qualificada

L.M.S., atualmente com 80 anos, foi condenada, em 2013, a um ano de reclusão e 10 dias-multa pelo juízo da Primeira Vara Criminal de Brasília (DF) por ter ofendido uma frentista de posto de combustíveis, chamando-a de “negrinha nojenta, ignorante e atrevida”. A prática foi enquadrada como crime de injúria qualificada pelo preconceito (artigo 140, parágrafo 3º, do Código Penal). Ao analisar recurso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o crime de injúria racial seria uma categoria do crime de racismo, que é imprescritível.

Equivalência

Em voto apresentado em novembro de 2020, o relator do HC, ministro Edson Fachin, concordou com o entendimento do STJ e negou o habeas corpus. Segundo o ministro, com a alteração legal que tornou pública condicionada (que depende de representação da vítima) a ação penal para processar e julgar os delitos de injúria racial, o crime passou a ser equivalente ao de racismo e, portanto, imprescritível, conforme previsto na Constituição Federal (artigo 5º, inciso LXII).

Prescrição

Único a divergir, o ministro Nunes Marques considerou que os crimes de racismo e injúria racial não se equiparam, o que possibilita a decretação da prescrição.

Crime inafiançável

Em voto-vista apresentado nesta tarde, o ministro Alexandre de Moraes observou que a Constituição é explícita ao declarar que o racismo é crime inafiançável, sem fazer distinção entre os diversos tipos penais que configuram essa prática. O ministro lembrou que, segundo os fatos narrados nos autos, a conduta praticada por L.M.S. foi uma manifestação ilícita, criminosa e preconceituosa em relação à condição de negra da vítima. “Como dizer que isso não é a prática de racismo?”, indagou.

Inferiorização da vítima

Segundo ele, não é possível reconhecer a prescrição em um caso em que foi demonstrado que a agressora pretendeu, claramente, inferiorizar sua vítima. Ele considera necessário interpretar de forma plena o que é previsto pela Constituição quanto ao crime de racismo, incluindo a imprescritibilidade, para produzir resultados efetivos para extirpar essa prática, “promovendo uma espécie de compensação pelo tratamento aviltante dispensado historicamente à população negra no Brasil e viabilizando um acesso diferenciado à responsabilização penal daqueles que, tradicionalmente, vêm desrespeitando os negros”, afirmou.

Racismo estrutural

No mesmo sentido, o ministro Luís Roberto Barroso observou que, embora com atraso, o país está reconhecendo a existência do racismo estrutural. Ele salientou que não são apenas as ofensas, pois muitas vezes a linguagem naturalizada embute um preconceito. “Não podemos ser condescendentes com essa continuidade de práticas e de linguagem que reproduzem o padrão discriminatório”, disse.

Também para a ministra Rosa Weber, as ofensas decorrentes da raça, da cor, da religião, da etnia ou da procedência nacional se inserem no âmbito conceitual do racismo e, por este motivo, são inafiançáveis e imprescritíveis.

Dignidade

No mesmo sentido, a ministra Cármen Lúcia considera que, nesse caso, o crime não é apenas contra a vítima, pois a ofensa é contra a dignidade do ser humano. Ela ressaltou que, de acordo com o Atlas da Violência, em 2018, os negros foram 75,7% das vítimas de homicídio. “Vivemos numa sociedade na qual o preconceito é enorme, e o preconceito contra pessoas negras é muito maior”, apontou.

Tratados internacionais

O ministro Ricardo Lewandowski salientou que a Constituição, ao estabelecer que a prática de racismo é imprescritível, não estipulou nenhum tipo penal. Segundo ele, isso ocorre porque, ao longo do tempo, essas condutas criminosas se diversificam e é necessário que os delitos específicos sejam definidos pelo Congresso Nacional. Lewandowski também lembrou que o Brasil é signatário de tratados e convenções internacionais em que se compromete a combater o racismo.

O ministro Dias Toffoli também acompanhou o entendimento pela imprescritibilidade do delito de injúria racial.

Efetividade das normas

Para o ministro Luiz Fux , presidente do STF, a discussão sobre a questão racial veio se desenvolvendo para assegurar proteção às pessoas negras e vem passando por uma série de mutações, alcançando uma dimensão social, e não meramente biológica. “As normas constitucionais dessa sociedade, que já foi escravocrata durante 400 anos e um péssimo exemplo para todo o mundo, só se podem tornar efetivas através não só da previsão em abstrato, mas da punição”, afirmou.

Processo relacionado: HC 154248

(Fonte: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=475646)

02) Crime de racismo - Não configuração - Denúncia equivocada - Eventual reconhecimento do delito de injúria racial demanda aditamento da inicial - Absolvição mantida:

APELAÇÃO CRIME. CRIMES DA LEI Nº 7.716/1989. RACISMO. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. Os elementos de convicção colhidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa não se prestam para elucidar a existência material do crime de racismo descrito na inicial. Negativa do réu acerca da prática delitiva que não foi rechaçada, por completo, pelo relato da vítima em pretório, nada tendo presenciado as demais testemunhas ouvidas, parte destas inclusive oferecendo versões alternativas ao ocorrido. Embora factível a ocorrência do fato nos moldes do artigo 20 da Lei nº 7.716/1989, parcos foram os elementos que indicaram tenha o réu efetivamente praticado, induzido ou incitado a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Verossimilhança da tese acusatória que em nada se coaduna com a necessária certeza à reconstituição processual do fato e à formação do convencimento motivado. Substratos que inclusive convergiriam à conclusão acerca de ilícito diverso daquele descrito pelo Promotor de Justiça, envolvendo a imputação de termos pejorativos referentes à raça do ofendido, mas com o nítido intuito de lesar-lhe a honra, caracterizando delito de injúria qualificada pelo uso de elemento racial nos termos do §3º do artigo 140 do Código Penal. Precedentes doutrinários e jurisprudencial. Recognição que não só exigiria prévio aditamento (art. 384 do CPP), este vedado em Segundo Grau de jurisdição, sob pena de violação ao que preconiza o Enunciado nº 453 das Súmulas do E. Supremo Tribunal Federal, mas também representação do ofendido que em concreto não veio oportunamente, decaindo, a vítima, de seu direito a teor do artigo 38 do CPP. Manutenção da sentença absolutória que se impõe e desprovimento do apelo ministerial. APELAÇÃO MINISTERIAL DESPROVIDA. (Apelação Crime Nº 70077289767, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Naele Ochoa Piazzeta, Julgado em 28/06/2018)

03) Crime de racismo - Negativa de pagar dívida à vítima em decorrência de sua cor (raça) - Tipicidade:

APELAÇÃO. DISCRIMINAÇÃO E INCITAÇÃO AO PRECONCEITO. ART. 20 DA LEI Nº 7.716/89. PRELIMINAR. REJEITADA. Não há falar em nulidade da audiência realizada no dia 07.11.14, em virtude da ausência de identificação das testemunhas, pois consta a identificação delas nos termos de depoimentos, inexistindo prejuízo à defesa. SUFICIÊNCIA DE PROVAS. Evidente a discriminação racial perpetrada pelo acusado ao se negar a efetuar o pagamento de quantia devida ao ofendido em virtude da cor da pele dele (negra), cujo comportamento é absolutamente reprovável no âmbito penal e constitucional e constitui o crime previsto no art. 20 da Lei n 7.716/89. PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO. Incabível a isenção da prestação pecuniária, já fixada no mínimo legal. Recurso desprovido. (Apelação Crime Nº 70076639756, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jucelana Lurdes Pereira dos Santos, Julgado em 24/05/2018)

04) Crime de racismo - Distribuição de panfletos em universidade - Conteúdo discriminatório - Tipicidade - Liberdade de expressão - Garantia não absoluta - Infração imprescritível:

APELAÇÃO CRIME. DISCRIMINAÇÃO E INCITAÇÃO AO PRECONCEITO CONTRA NEGROS. ART. 20, § 2º, DA LEI Nº 7.716/1989. PRELIMINAR REJEITADA. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO E DO APENAMENTO. 1. Preliminar de nulidade decorrente da afronta ao princípio da identidade física do juiz rejeitada porque não se tratava de regra cogente e absoluta, encontrando exceções na própria legislação então vigente e que se aplicam à espécie. 2. A discriminação racial perpetrada pelo acusado e veiculada através do panfleto de autoria dele, distribuído na Universidade onde estudava, resultou configurada quando ele externou seu menosprezo e apontou a inferioridade cultural, intelectual e até reprodutiva dos negros, conduta absolutamente reprovável na órbita constitucional e penal. 3. Nesse sentido, a tutela constitucional de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, vem estampada desde o preâmbulo da Carta Constitucional brasileira, a qual preceitua a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, III, da CF). Dentre os objetivos fundamentais da República Federativa está a promoção do bem estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, IV, da CF), prevendo, inclusive, que "a lei punirá qualquer forma de discriminação aleatória dos direitos e liberdades fundamentais" (art. 5º, XLI, da CF). O repúdio aos autores de delitos dessa natureza é tão grande, em virtude da gravidade e repulsividade da ofensa, que a Carta Constitucional ainda prevê a cláusula da imprescritibilidade dessas condutas. 4. As afirmativas de que os negros são inferiores cultural, reprodutiva e intelectualmente e que a miscigenação geraria um verdadeiro "genocídio" ou "exterminação racial", constantes do panfleto de autoria do acusado e por ele distribuídos a professores e alunos da instituição, se amoldam inequivocamente ao art. 20 da Lei nº 7.716/89, uma vez que, assim agindo, ele induziu e incitou a discriminação contra os negros. 5. A prática criminosa perpetrada pelo recorrente não pode ser confundida com a liberdade de expressão, haja vista que esta garantia constitucional não é absoluta, encontrando limites morais e jurídicos. 6. Manutenção da condenação e do apenamento. PRELIMINAR REJEITADA. APELO IMPROVIDO. (Apelação Crime Nº 70070420898, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cristina Pereira Gonzales, Julgado em 14/09/2016)

05) Crime de racismo - Parlamentar autor - Imunidade - Liberdade de expressão - Finalidade específica do tipo não verificada - Conteúdo político - Xenofobia - Crime de perigo abstrato:

DIREITO PENAL – EXCLUSÃO DO CRIME

Imunidade parlamentar e liberdade de expressão - 2

A Primeira Turma, por maioria, rejeitou denúncia apresentada contra deputado federal, por suposta prática do delito tipificado no art. 20, caput (1), da Lei 7.716/1989, por duas vezes, na forma do art. 70 (2) do Código Penal (CP). De acordo com a peça acusatória, o parlamentar, durante palestra, teria se manifestado, de modo negativo e discriminatório, sobre quilombolas, indígenas, refugiados, mulheres e LGBTs (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros) (Informativo 913).  O colegiado entendeu não configurado o conteúdo discriminatório das declarações do acusado, as quais, além de se inserirem na liberdade de expressão prevista no art. 5º, IV (3), da Constituição Federal (CF), estão cobertas pela imunidade parlamentar, a que se refere o art. 53, da CF (4). Observou que a narrativa contém a exposição de fato supostamente delitivo e das circunstâncias alusivas à prática. Foram individualizados os comportamentos imputados a título de ofensas dirigidas contra quilombolas e estrangeiros, estabelecendo-se vínculo de causalidade no tocante ao acusado, e especificadas as falas tidas como caracterizadoras do tipo penal. Asseverou que, consoante se depreende do discurso proferido pelo acusado em relação a comunidades quilombolas, as afirmações, embora consubstanciem entendimento de diferenciação e até de superioridade, são desprovidas da finalidade de repressão, dominação, supressão ou eliminação. Assim, por não se investirem de caráter discriminatório, são incapazes de caracterizar o crime previsto no art. 20, caput, da Lei 7.716/1989. Considerou que os pronunciamentos do parlamentar contidos na peça acusatória estão vinculados ao contexto de demarcação e proveito econômico das terras e configuram manifestação política que não extrapola os limites da liberdade de expressão. Não se pode confundir o interesse na extinção ou diminuição de reservas indígenas ou quilombolas com a supressão e eliminação dessas minorias. Ademais, o emprego, no discurso, do termo arroba não consiste em ato de desumanização dos quilombolas, no sentido de comparação a animais, mas forma de expressão – de toda infeliz –, evocada a fim de enfatizar estar um cidadão específico do grupo acima do peso considerado normal. Quanto à incitação a comportamento xenofóbico, reputou insubsistentes as premissas apresentadas pela acusação. O delito é de perigo abstrato, cuja tipicidade há de ser materializada teleologicamente. Embora não se exija que do discurso dito incitador sobrevenha a efetiva prática de atos discriminatórios, é imprescindível a aptidão material do teor das falas a desencadeá-los. No caso, as afirmações do denunciado se situam no âmbito da crítica à política de imigração adotada pelo Governo e não revelam conteúdo discriminatório ou passível de incitar pensamentos e condutas xenofóbicas pelo público ouvinte. O próprio acusado diz não fazer distinção quanto à origem estrangeira do imigrante. A crítica também se insere na liberdade de manifestação de pensamento, insuscetível, portanto, de configurar crime. Observou, por fim, que o convite referente à palestra se deu em razão do exercício do cargo de deputado federal ocupado pelo acusado, a fim de proceder à exposição de visão geopolítica e econômica do País. A Turma reconheceu a vinculação das manifestações apresentadas na palestra com pronunciamentos do parlamentar na Câmara dos Deputados. Concluiu que, comprovado o nexo de causalidade entre o que veiculado e o mandato, tem-se a imunidade parlamentar. As declarações, ainda que dadas fora das dependências do Congresso Nacional e, eventualmente, sujeitas a censura moral, quando retratam o exercício do cargo eletivo, a atuação do congressista, estão cobertas pela imunidade parlamentar e implicam na exclusão da tipicidade. Vencido o ministro Roberto Barroso, que recebeu a denúncia, em parte, quanto aos pronunciamentos sobre quilombolas, afrodescendentes, e sobre homossexuais, enquadrando-os nos delitos previstos, respectivamente, no art. 20 da Lei 7.716/1989 e de incitação ao crime e apologia de crime, constantes dos artigos 286 e 287 (5) do CP. Vencida a ministra Rosa Weber que, ao retificar o voto precedente, acompanhou a divergência apenas quanto às declarações referentes aos quilombolas.

(1) Lei 7.716/1989: “Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.”

(2) CP: “Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior.”

(3) CF: “Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;”

(4) CF: “Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.”

(5) CP: “Art. 286 - Incitar, publicamente, a prática de crime (...) Art. 287 - Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime: (...)”

STF - Inq 4694/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 11.9.2018. (Inq-4694)

06) Discriminação - Crimes de homofobia e transfobia - Comunidade LGBT - Omissão legislativa - Criminalização:

DIREITO CONSTITUCIONAL – AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO (Informativo n.º 941 do STF – Plenário)

Homofobia e omissão legislativa – 3

O Plenário retomou o julgamento conjunto de ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO) e mandado de injunção ajuizados em face de alegada omissão legislativa do Congresso Nacional em editar lei que criminalize os atos de homofobia e transfobia (Informativos 930 e 931).

O partido político autor da ação direta de inconstitucionalidade por omissão alega inércia legislativa do Congresso Nacional em apreciar proposições legislativas apresentadas com o objetivo de incriminar todas as formas de homofobia e transfobia e, assim, garantir efetiva proteção jurídico-social aos integrantes da comunidade LGBT.

Já o impetrante do mandado de injunção aponta a mora do Congresso no sentido de proceder à criminalização específica de todas as formas de homofobia e transfobia, especialmente das ofensas individuais e coletivas, bem como de homicídios, agressões, ameaças e discriminações motivadas pela orientação sexual ou identidade de gênero.

Nesta assentada, o ministro Celso de Mello (relator da ADO) noticiou o recebimento, pouco antes do início da sessão, de comunicação do Senado Federal. No expediente, aquele órgão fez saber que: (i) a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania daquela Casa (CCJ), em 22.5.2019, aprovou substitutivo do relator ao Projeto de Lei 672/2019, que aprimora a Lei 7.716/1989 para incluir os crimes de discriminação ou preconceito de orientação sexual e/ou identidade de gênero. O substitutivo será submetido a turno suplementar, em apreciação terminativa; e (ii) na mesma reunião ordinária, a CCJ aprovou, em caráter terminativo, o Projeto de Lei 191/2017, que altera a redação do art. 2º da Lei 11.340/2006, para incluir, entre os valores protegidos pela Lei Maria da Penha, também a identidade de gênero, como forma de atender aos indivíduos transgêneros identificados com o sexo feminino. Na parte final, a comunicação, em atenção ao dever das partes de colaborar com o Poder Judiciário, informa os aludidos fatos supervenientes que demonstram estar a matéria objeto de apreciação do Supremo Tribunal Federal (STF) sendo apreciada pelo Senado Federal, no exercício de sua competência constitucional típica de aprimorar a legislação penal existente.

O colegiado passou, então, a examinar questão relativa à prejudicialidade do processamento e definitiva conclusão do julgamento do processo de controle normativo abstrato. Por maioria, decidiu dar regular prosseguimento à ação.

Prevaleceu o voto do ministro Celso de Mello, que compreendeu não se registrar situação configuradora de prejudicialidade. O relator da ADO asseverou que a mera existência de proposições legislativas em trâmite no Congresso Nacional não tem o condão de afastar, por si só, a configuração, na espécie, de inércia por parte do Poder Legislativo.

Não se desconheceu que o STF, no passado, veio a acolher o entendimento de que a mera instauração do processo legislativo, com o envio do correspondente projeto de lei às Casas do Congresso Nacional para deliberação e aprovação, descaracterizaria, por si só, a configuração da mora no adimplemento da imposição constitucional. Essa diretriz, no entanto, ficou integralmente superada pela jurisprudência após o exame em Plenário da ADI 3.682, em maio de 2007. Na ocasião, o STF assinalou que o estado de mora legislativa pode restar configurado tanto na fase inaugural do processo de elaboração das leis (mora agendi) quanto no estágio de deliberação sobre as proposições já veiculadas (mora deliberandi), desde que evidenciada, pela superação excessiva de prazo razoável, inércia abusiva e inconstitucional do Poder Legislativo. Admitiu-se que a inertia deliberandi das Casas Legislativas pode ser objeto da ação direta de inconstitucionalidade por omissão. O entendimento sobre a questão a envolver a mora decorrente da inertia deliberandi foi reafirmado na ADO 25.

No caso da ADO 26, passaram-se trinta anos desde o início da vigência da Constituição Federal de 1988 (CF) e dezoito, pelo menos, a contar da apresentação, perante a Câmara dos Deputados, de projeto de lei com o intuito de dar implementação efetiva às cláusulas constitucionais em exame.

O relator sublinhou que a constatação objetiva de hipótese de mora inconstitucional, apta a instaurar situação de injusta omissão geradora de manifesta lesividade à posição jurídica das pessoas tuteladas pela cláusula constitucional inadimplida [CF, art. 5º, XLI e XLII (1)], justifica, plenamente, a intervenção do Poder Judiciário, notadamente a do STF. Na espécie, subsiste a mora legislativa, caracterizada pelo estado de inertia deliberandi dos órgãos estatais.

Ainda ponderou que, também por essa razão, em sede de ações de mandado de injunção, a Corte tem reconhecido, em sucessivos precedentes, que o retardamento abusivo na regulamentação legislativa do texto constitucional, não obstante a existência de projetos de lei em tramitação, qualifica-se como requisito autorizador da concessão da ordem injuncional.

Noutro passo, o ministro discorreu sobre a complexidade do iter formativo das leis, cujo processo de elaboração pode estender-se por longo período de tramitação em ambas as Casas do Congresso Nacional, uma vez que o procedimento legislativo é regido, em nosso sistema constitucional, pelo modelo que consagra a prática do bicameralismo. O processo de formação das leis é composto de três fases rituais distintas: (i) fase introdutória (apresentação da proposição legislativa); (ii) fase constitutiva, que se desenvolve primeiro na instância parlamentar e depois no Poder Executivo (sanção e/ou veto); e (iii) fase complementar (promulgação e publicação da lei).

Por fim, advertiu que, apesar das deliberações em caráter terminativo, o procedimento de elaboração legislativa das proposições divulgadas na comunicação do Senado sequer se acha concluído na esfera daquela Câmara Alta.

Vencidos os ministros Marco Aurélio e Dias Toffoli (presidente), que reputaram ser conveniente a suspensão do julgamento para aguardar-se os trabalhos a serem desenvolvidos no Congresso Nacional.

Ato contínuo, o Plenário deu andamento ao exame da ADO e do mandado de injunção. Votaram os ministros Rosa Weber e Luiz Fux, que acompanharam o pronunciamento de ambos os relatores.

Em seguida, o julgamento foi suspenso.

(1) CF/1988: “Art. 5º (...) XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;”

ADO 26/DF, rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 23.5.2019. (ADO-26)

MI 4733/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 23.5.2019. (MI-4733)

DIREITO CONSTITUCIONAL – AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO (Informativo n.º 944 do STF – Plenário)

Homofobia e omissão legislativa – 4  

Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, julgou procedentes os pedidos formulados em ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO) e em mandado de injunção (MI) para reconhecer a mora do Congresso Nacional em editar lei que criminalize os atos de homofobia e transfobia. Determinou, também, até que seja colmatada essa lacuna legislativa, a aplicação da Lei 7.716/1989 (que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor) às condutas de discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero, com efeitos prospectivos e mediante subsunção.

​Prevaleceram os votos dos ministros Celso de Mello e Edson Fachin, relatores da ADO e do MI, respectivamente (Informativo 931). A corrente majoritária reconheceu, em suma, que a omissão do Congresso Nacional atenta contra a Constituição Federal (CF), a qual impõe, nos termos do seu art. 5º, XLI e XLII (1), inquestionável mandado de incriminação. Entendeu que as práticas homotransfóbicas se qualificam como espécies do gênero racismo, na dimensão de racismo social consagrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do HC 82.424/RS (caso Ellwanger). Isso porque essas condutas importam em atos de segregação que inferiorizam os integrantes do grupo de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais (LGBT), em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero. Considerou, ademais, que referidos comportamentos se ajustam ao conceito de atos de discriminação e de ofensa aos direitos e liberdades fundamentais dessas pessoas.

​Na ADO, o colegiado, por maioria, fixou a seguinte tese:

1. Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08.01.1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”);

2. A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer que seja a denominação confessional professada, a cujos fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e líderes ou celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outros) é assegurado o direito de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordo com o que se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem assim o de ensinar segundo sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público ou privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero;

3. O conceito de racismo, compreendido em sua dimensão social, projeta-se para além de aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta, enquanto manifestação de poder, de uma construção de índole histórico-cultural motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e destinada ao controle ideológico, à dominação política, à subjugação social e à negação da alteridade, da dignidade e da humanidade daqueles que, por integrarem grupo vulnerável (LGBTI+) e por não pertencerem ao estamento que detém posição de hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos e diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico, expostos, em consequência de odiosa inferiorização e de perversa estigmatização, a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de proteção do direito”.

​Ficaram vencidos, em ambas as ações, os ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Marco Aurélio.

​Os dois primeiros conheceram em parte das ações e as julgaram parcialmente procedentes apenas para reconhecer a mora legislativa e dar ciência ao Congresso Nacional para a adoção das providências necessárias. Para eles, não obstante a repugnância que provocam as condutas preconceituosas de qualquer tipo, somente o Poder Legislativo pode criminalizar condutas, sendo imprescindível lei em sentido formal. Portanto, a extensão do tipo penal para abarcar situações não especificamente tipificadas pela norma penal incriminadora atenta contra o princípio da reserva legal (2). ​O ministro Marco Aurélio inadmitiu o MI, diante dos limites impostos ao exercício, pelo STF, da jurisdição constitucional. Admitiu, em parte, a ADO, para julgar, nessa extensão, improcedente o pedido, por não assentar, peremptoriamente, que se tenha “criminalizar” no vocábulo “punirá”, contido no inciso XLI do art. 5º da CF. Em decorrência disso, não reconheceu a omissão legislativa quanto à criminalização específica da homofobia e da transfobia. Concluiu que, respeitada a liberdade legiferante franqueada ao legislador ordinário, espera-se que a sinalização do STF quanto à necessária proteção das minorias e dos grupos socialmente vulneráveis contribua para a formação de uma cultura livre de todo e qualquer preconceito e discriminação, preservados os limites da separação dos Poderes e da reserva legal em termos penais.

(1) CF/1988: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:(...) XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;”

(2) CF/1988: “Art. 5º (...) XXXIX – não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;”

ADO 26/DF, rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 13.6.2019. (ADO-26)

MI 4733/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 13.6.2019. (MI-4733)

 

07) Ofensas contra pessoas LGBTQIAPN+ - Racismo - Omissão legislativa - Homotransfobia - Crime de injúria racial:

Notícias do STF - 22/08/2023

STF equipara ofensas contra pessoas LGBTQIAPN+ a crime de injúria racial

A decisão afasta interpretação que retirava parte da aplicabilidade da decisão do Plenário sobre a criminalização da homotransfobia.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu que atos ofensivos praticados contra pessoas da comunidade LGBTQIAPN+ podem ser enquadrados como injúria racial. A decisão foi tomada na sessão virtual concluída em 21/8, no julgamento de recurso (embargos de declaração) apresentado pela Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT) contra acórdão no Mandado de Injunção (MI) 4733.

Enquadramento

No julgamento do mandado de injunção, em junho de 2019, o Tribunal havia reconhecido a omissão do Congresso Nacional em criminalizar a discriminação por identidade de gênero e orientação sexual e determinado o enquadramento da homotransfobia no tipo penal definido na Lei do Racismo (Lei 7.716/1989), até que o Legislativo edite lei sobre a matéria.

Interpretação equivocada

Nos embargos, a ABGLT alegava que essa decisão tem sido interpretada de forma equivocada, no sentido de que a ofensa contra grupos LGBTQIAPN+ configura racismo, mas a ofensa à honra de pessoas pertencentes a esses grupos vulneráveis não configura o crime de injúria racial (artigo 140, parágrafo 3º, do Código Penal). Segundo a associação, isso retira, em grande parte, a aplicabilidade prática da decisão do Plenário, e, por isso, pediu que se defina que o entendimento também se aplica ao crime de injúria racial.

Desamparo

Em seu voto pelo acolhimento do recurso, o relator, ministro Edson Fachin, explicou que, no julgamento do Habeas Corpus (HC) 154248, também de sua relatoria, o STF já havia reconhecido que o crime de injúria racial é espécie do gênero racismo e, portanto, é imprescritível. Essa posição também foi inserida na legislação pelo Congresso Nacional por meio da Lei 14.532/2023. Assim, para o relator, uma vez que a Corte, no julgamento do MI, reconheceu que a discriminação por identidade de gênero e orientação sexual configura racismo, a prática da homotransfobia pode configurar crime de injúria racial. "A interpretação que restringe sua aplicação aos casos de racismo e mantém desamparadas de proteção as ofensas racistas perpetradas contra indivíduos da comunidade LGBTQIAPN+ contraria não apenas o acórdão embargado, mas toda a sistemática constitucional", afirmou.

Ampliação

Ficou vencido o ministro Cristiano Zanin, para quem a análise da matéria não é possível no âmbito de embargos de declaração, pois seria um novo julgamento do MI com ampliação do mérito.

Processo relacionado: MI 4733

(Fonte: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=512663)

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MANDADO DE INJUNÇÃO. DEVER DO ESTADO DE CRIMINALIZAR AS CONDUTAS ATENTATÓRIAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. HOMOTRANSFOBIA. DISCRIMINAÇÃO INCONSTITUCIONAL. OMISSÃO DO CONGRESSO NACIONAL. HOMOTRANSFOBIA COMO RACISMO POR RAÇA. INJÚRIA RACIAL COMO ESPÉCIE DE RACISMO. PRECEDENTES. ATOS DE HOMOTRANSFOBIA PRATICADOS CONTRA MEMBROS DA COMUNIDADE LGBTQIA+ CONFIGURAM INJÚRIA RACIAL. OBSCURIDADE. EMBARGOS ACOLHIDOS

1. Diferentemente dos demais recursos, os embargos de declaração não se prestam a reforma da decisão, sendo cabíveis apenas nos casos de obscuridade, contradição ou omissão da decisão impugnada, bem como para corrigir eventual erro material (art. 1.022, do Código de Processo Civil.

2. Mandado de injunção julgado procedente, para (i) reconhecer a mora inconstitucional do Congresso Nacional e; (ii) aplicar, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito, a Lei 7.716/89 à discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero.

3. O crime de injúria racial reúne todos os elementos necessários à sua caracterização como uma das espécies de racismo e por ser espécie do gênero racismo, o crime de injúria racial é imprescritível. Precedentes. Entendimento positivado pela Lei 14.532/2023.

4. Tendo em vista que a injúria racial constitui uma espécie do crime de racismo, e que a discriminação por identidade de gênero e orientação sexual configura racismo por raça, a prática da homotransfobia pode configurar crime de injúria racial.

5. Embargos de Declaração conhecidos e acolhidos para sanar obscuridade.

 

20

Art. 20-A. Os crimes previstos nesta Lei terão as penas aumentadas de 1/3 (um terço) até a metade, quando ocorrerem em contexto ou com intuito de descontração, diversão ou recreação.     (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

20-A

Art. 20-B. Os crimes previstos nos arts. 2º-A e 20 desta Lei terão as penas aumentadas de 1/3 (um terço) até a metade, quando praticados por funcionário público, conforme definição prevista no Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las.      (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

Legislação correlata:

- Vide: Art. 327 do Código Penal - Conceito de funcionário público.

20-C
20-B

Art. 20-C. Na interpretação desta Lei, o juiz deve considerar como discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado à pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência.      (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

Art. 20-D. Em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a vítima dos crimes de racismo deverá estar acompanhada de advogado ou defensor público.     (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

20-D

Art. 21. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. (Renumerado pela Lei n.º 8.081, de 21.9.1990)

Art. 22. Revogam-se as disposições em contrário. (Renumerado pela Lei n.º 8.081, de 21.9.1990)

 

Brasília, 5 de janeiro de 1989; 168.º da Independência e 101.º da República.

 

JOSÉ SARNEY

Paulo Brossard

Este texto não substitui o publicado no DOU de 6.1.1989 e retificada em 9.1.1989

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